Naisy Carvalhais Bernardino é Sócia Advogada da Jacó Coelho Advogados Associados
OAB/GO nº 33835
Na última quarta-feira, dia 29/05 a Câmara dos Deputados aprovou a MP 867/18 que irá regularizar a questão ambiental no país. Essa medida provisória muda alguns pontos do Código Florestal, Lei n. 12.651/12, no que tange às exigências de recuperação de reserva legal[1].
Originalmente, o texto apenas prorrogava o prazo de adesão do produtor rural ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) até 31 de dezembro de 2019, podendo ser prorrogado por mais 1 (um) ano. A matéria, convém esclarecer, ainda será enviada ao Senado.
A PRA existe para verificar a condição de recuperação das áreas de preservação permanente, de reserva legal e de uso restrito, estabelecendo em quais casos deve haver recomposição florestal, contudo, vale ressaltar que para ter direito a esse benefício é obrigatória a inscrição do imóvel rural ao CAR (Cadastro Ambiental Rural)[2]. A implantação do Programa de Regularização Ambiental está previsto no Art. 59, do atual Código Florestal.
A MP foi criada inicialmente apenas para prorrogar o prazo do PRA, tendo em vista que alguns Estados não criaram o CAR e os proprietários rurais foram impedidos de se inscrevem no programa,
portanto, tal medida evitaria que esses proprietários pagassem multa.
Contudo, o texto da MP foi ampliado e traz outras situações para discussão. De acordo com o projeto de lei de conversão, os proprietários que desmataram áreas de reserva legal poderão calcular o total a recuperar com base em percentuais anteriores ao atual Código Florestal e somente sobre o que existia de vegetação nativa na época.
Assim, há interpretação de que esses percentuais de reserva legal poderão ser reduzidos de 80% para 50% no caso da Amazônia, de 35% para 20% no Cerrado, entre outros. O atual Código Florestal dispensa os proprietários de recuperação da área se eles obedecem ao percentual exigido à época do aumento.
O texto legal que está em votação, dispensa ainda a anuência do órgão ambiental competente da época na qual os índices foram mudados.
Ademais, em se tratando de outros biomas como Pantanal, o Pampa, a Caatinga, os campos gerais e os de altitude, deverá ser calculada uma reserva legal de 20% da propriedade sobre o que havia de vegetação nativa no ano de 2000 (MP 1.956/50).
Vale ressaltar que nos casos de altitude se a exploração for pecuária, pastejo animal e manejo, estão
liberados em toda área consolidada, transformando a área de reserva em área de uso econômico.
No caso de anistia a MP prevê que em casos de imóveis de até quatro módulos fiscais[3], estende a reserva legal a outros trechos da propriedade que não estavam classificados formalmente como
reserva legal.
Com a MP, a inscrição no CAR continua sendo condição obrigatória para adesão no PRA, e acrescenta que a partir de 31 de dezembro de 2020, também será necessário sua inscrição para concessão de crédito rural, créditos de custeio e de investimentos.
Vale ressaltar que os Estados em que está localizada a propriedade rural que não tiverem implementado o PRA até dezembro de 2020, a adesão deverá ocorrer perante o programa federal. Ou seja, os proprietários não poderão mais usar a desculpa de que seu Estado não implementou o programa e por isso não fez seu cadastro.
Após o preenchimento do cadastro, caso exista passivo ambiental, conforme as novas regras da MP, o órgão ambiental deverá notificar o proprietário para assinar um termo de compromisso sobre as áreas a serem recompostas.
Caberá ainda ao autuado optar entre pagar a multa, aderir ao PRA ou aderir a outro programa governamental de conversão de multas em serviços ambientais.
Há algumas discussões sobre o texto legal da MP que estão em votação. O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, por exemplo, disse que “se a medida for aprovada pelo Senado e sancionada, irá à Justiça devido a proibição de retrocesso, no direito ambiental”. Já o relator da MP, deputado, Sérgio Sousa, diz que “a menção do uso de lei da época para reserva legal já está previsto no Código Florestal, e o que agora se discute é maior segurança ao produtor rural”.
Diante de tais apontamentos, podemos verificar que muitas áreas que foram desmatadas e que faziam parte a reserva legal não serão recompostas, pois o percentual irá diminuir, ademais, aumentará os casos de anistia. Estaríamos então falando de um retrocesso, numa época em que lutamos tanto pela preservação ambiental? Ademais, devemos lembrar que a fiscalização ambiental cabe atualmente aos Estados e não a União, e a nova medida acaba trazendo essa responsabilidade à União quando não cumprida pelo Estado. O que se espera é que tais medidas sejam eficientes.
[1]
Conforme dispõe o Art. 3º, III, do Código Florestal, “Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa”.
[2]
O CAR (Cadastro Ambiental Rural) é um registro público, eletrônico, de abrangência nacional feito junto ao órgão ambiental competente. Criado pelo Novo Código Florestal Brasileiro, Lei n.º 12.651 de 25 de maio de 2012 e regulamentado pelo Decreto nº 7.830, de 17 de outubro de 2012, o registro é obrigatório para todos os imóveis rurais e tem como finalidade integrar as
informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.
[3]
Módulo fiscal é uma unidade de medida agrária usada no Brasil, instituída pela Lei nº 6.746, de 10 de dezembro 1979. Vale ressaltar que o módulo fiscal varia de acordo com cada Estado.