Por Ernane Nardelli – OAB/GO 23.368
Advogado. Sócio da Jacó Coelho Advogados. Tem especialização em Direito Civil e Processo Civil pela ATAME/GO; especialização em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela ATAME/GO e LLM em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.
A contratação de prestadores de serviço por meio de pessoa jurídica (PJ) se tornou prática comum em muitas empresas. Com a promessa de redução de custos e maior flexibilidade, a chamada “pejotização” parece, à primeira vista, uma solução eficiente para o mercado de trabalho. Mas há um limite e, quando ele é ultrapassado, os riscos jurídicos são sérios.
A pejotização é considerada fraudulenta quando usada como forma de mascarar uma relação de emprego. Em vez de contratar formalmente um trabalhador, a empresa exige e incentiva que ele abra um CNPJ para prestar os mesmos serviços com subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade, os quatro elementos clássicos do vínculo empregatício. Quando esses requisitos estão presentes, pouco importa se o contrato está assinado com uma empresa: o Judiciário pode reconhecer a existência de vínculo e impor à empresa o pagamento de verbas trabalhistas, multas e encargos retroativos.
Decisões recentes da Justiça do Trabalho têm sido firmes nesse sentido. Tribunais em todo o país têm reconhecido a existência de vínculo empregatício em casos de pejotização e condenado empresas ao pagamento de valores expressivos, inclusive com repercussões previdenciárias e fiscais. Em alguns casos, há o risco de ações civis públicas, investigações do Ministério Público do Trabalho e inclusão em cadastros de empregadores infratores.
É claro que nem toda contratação de PJ é irregular. Profissionais autônomos ou empresas prestadoras de serviços especializados podem, sim, atuar de forma legítima e sem vínculo trabalhista. O que diferencia uma terceirização lícita de uma pejotização ilícita é, justamente, a forma como a relação se desenvolve no dia a dia.
Para evitar esse tipo de passivo, é necessário revisar contratos, avaliar a real autonomia dos prestadores, evitar cláusulas que indiquem controle hierárquico e manter registros que comprovem a independência da prestação de serviço. Além disso, sempre que possível, adotar modelos formais de terceirização por meio de empresas com estrutura mínima, que atuem com múltiplos clientes e emitam notas fiscais regulares.
Prevenir é sempre mais eficiente e menos oneroso do que remediar. Em tempos de decisões imprevisíveis e alta judicialização, empresas que ignoram os riscos da pejotização colocam em xeque sua saúde financeira, sua governança e até a continuidade de suas operações. Mais do que cumprir a lei, é preciso compreender os limites da autonomia contratual e estruturar relações de trabalho que resistam ao teste do tempo e da Justiça.